sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Balbúrdia das letras: Cataclismo - texto que estará no livro a ser lança...

Balbúrdia das letras: Cataclismo - texto que estará no livro a ser lança...: Cataclismo Os olhos dele pairavam embevecidos pelo negro forte e dominador que emanava das estrelas que ela tinha na face. Os cabelos ...

Cataclismo - texto que estará no livro a ser lançado no dia 28 de novembro



Cataclismo

Os olhos dele pairavam embevecidos pelo negro forte e dominador que emanava das estrelas que ela tinha na face. Os cabelos dela, trigo ao vento, dominavam o ar e levavam o cheiro dela até a alma dele. Ele sequer a mirava, tinha medo desta feminilidade forte que enchia seus pulmões e o fazia ser um fiel, pouco mais que um crédulo desta deusa que a tudo encantava. A simples presença dela era mágica, música e encantamento. Os pequenos pés de menina, desenhos inverossímeis flutuavam acariciando o chão como se terra e ser fossem um só elemento, como se fosse o solo em seu corpo, miríade de sonhos, simplicidade da perfeição.
Um apaixonado acovardado pela intensidade deste fogo que o consumia e o cegava e calava, e o fazia sonhar, noite após noite com os mesmos lençóis, o mesmo cetim azul escarlate, onde esta ninfa em panos brancos se entregava, em lagos, em rios, em mares, em água, em muita água, em cristalina e corrente água, em fresca, fria, volátil, forte, construtiva, destruidora água. A voz era de água; suas frases eram nascentes; seus pensamentos cataratas; seu corpo um remanso e sua feminilidade um maremoto adormecido, que só a alquimia perfeita do corpo do amado, para sempre e desde sempre esperado, podia fazer eclodir; desbarrancando margens, destroçando dúvidas, submergindo folhas mortas, recriando ilhas ignotas, alimentando chuvas, redesenhando solos.
Um dia ele driblaria aquele torpor e lhe diria que era ele. Sim, ele o elemento fogo, a descongelar Icebergs, e devastar dúvidas, e inundar cidades, e recriar o tempo para que ela fosse só mulher. Mulher, destino duro e mortificador. Mulher de cama, tantas vezes penetrada, tantas vezes morreria, égua em cavalgada, para renascer outra, absoluta, triunfante num poema obscuro, recriando a ternura, bagunçando a meiguice, vivendo toda a sua dualidade de cadela e santa, beijo e cópula, amizade e volúpia. Mulher amada, infinitamente e profundamente amada, mulher que engoliria com seu corpo o frágil ser homem e faria dele um universo em êxtase, em equilíbrio e dança, em febril perda de sentidos, em pueril aventura diabólica, em viril desespero de comer, de engolir, de mastigar aquela carne feminina, de sentir o sangue de ambos correr numa única veia, até se perderem os fluxos de maneira que um coração só comandaria os ritmos, e este ritmo louco e único seria a única coisa que faria sentido.
Sim, ele lhe tocaria o ventre, o útero, despudoramente com fervor religioso. E ao tentar dominá-la seria vencido. Depois mil vezes derrotado, mil vezes mortificado, mil vezes ensandecido e, por fim, como uma menino, em seu regaço adormecido. Seu rosto naqueles seios, pequenos caroços de fruta, restos de melaço a serem sugados, a melarem o céu da boca, a desafiar a lógica com suas pontas duras a acusar arrepios de um corpo que ferve no caos do amor. E todos os outros cataclismos aconteceriam entre estes dois corpos, vulcões, terremotos, batalhas sangrentas em que ambos morreriam para o mundo e renasceriam num espaço inexistente, numa dimensão de pensamentos e desejos somente, de fantasia erótica, de despudorado tesão, de imaculado querer, de inesgotável gozo, de repetida cópula, de inumeráveis posições, de tigresa e gato, de cadela e potro, de dragão e frágil donzela, de puta veterana e de adolescente insaciável.
A vida então seria mais perfeita que a poesia, e nos olhos deles poderia se adivinhar o significado de tudo.

Balbúrdia das letras: A sociedade do fruir e a sociedade do trabalho com...

Balbúrdia das letras: A sociedade do fruir e a sociedade do trabalho com...: A Sociedade do Fruir e a Sociedade do Trabalho Compulsivo Um belo dia seu pai te chama e te diz: - Filho, você precisa toma...

A sociedade do fruir e a sociedade do trabalho compulsivo, texto do meu livro a ser lançado dia 28 de novembro, todos ao lançamento


A Sociedade do Fruir e a Sociedade do Trabalho Compulsivo

Um belo dia seu pai te chama e te diz:
- Filho, você precisa tomar um rumo. Você precisa ser alguém na vida.
Você então descobre que não é nada. Que sua vida até aquele momento nada foi, porque você é ninguém. Mas, como pode? Como será que você, nesta época na adolescência, ou pouco depois dela, não ser nada, não significar como pessoa coisa nenhuma? Este diálogo muito real e comum revela muito do Fetiche da Mercadoria da nossa sociedade. Demonstra que tudo tem que passar pelo buraco de agulha do Valor para ser reificado e incorporado no mundo “real”. Enquanto você nada possui, você não é nada. Nem mesmo é humano. Sua humanidade, existência, sentido de existir tem de estar corporificado em alguma função do Valor. Só será reconhecido como máquina reprodutora de valor. Pouco importa sua função. Médico, jurista, professor, motorista, operário, de algum modo você tem de reproduzir a lógica de produção e reprodução do Capital. Vender-se e comprar muito, muito além da própria necessidade de comprar e vender o que é necessário para viver. Na verdade, viver então subsume-se a comprar e vender muito, quando der por conta, você estará empenhado por muitos anos, financiando seu próprio trabalho, com dívidas longuíssimas, que prometem que você será escravo dos produtos que consome durante décadas, até quase à beira da morte, tendo em vista que nossas sociedades agora prolongam a idade limite das pessoas se livrarem da escravidão assalariada, na idéia de que deve se aumentar a “idade produtiva”.
Mas, que diabo de idade produtiva é esta? Produtiva como? Para quem e para que? Numa sociedade que parou de se pensar, os indivíduos pararam de raciocinar, de questionar esta lógica perversa. O trabalho é um fim em si, que nunca jamais pode ser questionado. Engrenagens, peças de uma moenda de triturar seres humanos, aprisionamos, agrilhoamos uns aos outros na lógica irracional de que o TRABALHO DIGNIFICA. Na verdade, o TRABALHO ESCRAVIZA.
Vivemos a contradição de aumentarmos a produtividade num grau jamais imaginado antes pela humanidade e, em lugar de diminuirmos nosso ritmo de trabalho, nosso compromisso, o comprometimento de nossas vidas, de nossas sagradas horas que temos como aventura neste planetinha azul e que jamais se repetirão, o tempo que resta é todo novamente dedicado ao Deus Trabalho que também é o Deus Manon (não é à toa que a grande festa anual de nossa sociedade seja o festejo da Mercadoria). Na cantilhena louca, que sem especialização não mais existe lugar num mercado, que cada vez mais vira um Deus ex Machina e um mito, as horas disponíveis para o desfrute de lazer viram horas de estudo e especialização. Não de estudo de música, língua, artes, dança ou qualquer coisa sem ligação com o valor. Que dê puro e simples prazer, que seja desfrute. Mas estudo que se torne Capital, que seja reconversível em mais salário para necessidades cada vez mais questionáveis, de uma sociedade de homens rendidos, prostrados a Manon, a este Deus Valor que nos diz que trabalhar desgraçadamente, sem pensar, penando é a razão da vida.
Num mundo onde uma colocação no mercado de trabalho cada vez mais se parece a uma fantasia louca neurótica do que a uma possibilidade real, as pessoas sequer conseguem enxergar que a antiga sociedade do trabalho está ferida de morte. Os trabalhos nos setores produtivos que caracterizavam a sociedade industrial fordista foram e estão sendo substituídos (mas não numa proporção que garanta emprego a todos) por ocupações sem nenhum especialização, e com um pagamento para lá de ordinário, devido a pressão que o imenso exército de desocupados coloca sobre o salário. Na verdade, o salário tem diminuído, em regra, tanto, que mais se parece com uma esmola. Há uma linha tênue separando quem está desempregado de quem tem um trabalho com salário miserável, e muitas vezes não se sabe muito bem o que rende mais, o emprego miserável ou o desemprego, onde a pessoa sobrevive de bicos ou de ajudas.
Completamente alienados de que não necessitamos viver assim, numa espécie de frenesi e loucura neurótica coletiva, disputamos a tapa os últimos lugares nas senzalas dos senhores de escravos. E a esquerda repete argumentos não muito sérios (e nos quais ela mesmo não acredita) de retomada de crescimento com criação de mais postos de trabalho. No fundo todos sabem que a sociedade do trabalho compulsivo, a sociedade capitalistas, o reino da necessidade está ferido de morte. Só que admitir isto é admitir irracionalidade de nosso modo de vida e fazer uma crítica de alto a baixo de uma sociedade que precisa reaprender a viver sem a rotina neurótica, compulsiva e louca do trabalho compulsivo.
A ideologia dominante de uma sociedade é a ideologia da Classe Dominante. Para a nossa elite mundial, a burguesia dona das senzalas, dos modernos meios de criar seres parciais neuróticos, escravizados a uma rotina entediante de escravização a seus próprios produtos, há que se falar sempre que criticar a sociedade do trabalho é loucura, “utopia”. De outro lado, a esquerda radical entende mais de materialismo histórico do que de dialético. Presa ao trabalho, até o nome de seus partidos carrega em seu seio o nome maldito da escravidão ao Trabalho. Poucos, talvez menos de 1% dos marxistas sequer ouviram falar na teoria marxista da abolição do trabalho, atacam esta palavra de ordem como se fosse “revisionismo reacionário”, quando na verdade é pura dialética marxista.
Não estamos tão longe assim desta abolição do trabalho. Quando Marx elaborou esta tese (deliciosamente defendida por Paul Lafargue em seu Direito à Preguiça), ele sabia que a evolução dos meios de produção não permitia ainda este vôo. Mas ele antevia que o Capital libertou forças produtivas poderosas que poderiam realizar por fim a libertação do homem. A libertação do homem não é uma pura e simples repartição social. Marx colocou isto de maneira sarcástica quando num intervenção disse: “eu não sou marxista”. Referia-se ao que ele chamou de marxistas vulgares, que viam o reino da liberdade, o comunismo, como uma sociedade de repartição pura e simples, onde todos teriam acessos a mesma quantidade de bens. Marx nunca pretendeu isto. Ele mostrou que esta concepção no fundo é burguesa, um socialismo pequeno burguês, porque o pequeno proprietário não consegue pensar além da sociedade do trabalho, não pode ver um mundo onde as idéias não passem pelo fio condutor do fetiche da mercadoria, não necessitem da reificação do valor. Portanto, não pode abstrair uma sociedade onde a valoração não seja pela quantidade de bens que tem um indivíduo, mas sim como e como ele pode fruir da vida.
A sociedade do trabalho compulsivo está numa crise crônica e terminal. Não tem mais como se reproduzir e só pode sair de suas crises alargando limites sociais que não são infinitos. O profundo fosso que o sistema cava entre uma humanidade que ainda consegue reproduzir sua existência dentro da forma Valor e a imensa maioria que vai sendo colocado à parte do processo de reprodução de vida através do Capital, não tem saída. Não há resposta, nem resgate para a imensa crise social que o Capital aprofunda dia a dia. Só um imbecil oligofrênico crônico acredita que, com a previsão que o número de favelados, de excluídos, de desempregados duplicará em apenas 30 anos, não terá conseqüências na retomada dramática e violenta dos conflitos sociais. Conflitos sociais que não terão saída, resolução na sociedade capitalista do valor. Por mais que ela invista no conflito, por mais que ela ser arme, por mais que ela aposte na barbárie e no extermínio massivo e indiscriminado de populações inteiras para manter íntegro o status quo dos donos das modernas senzalas.
Nenhum sistema que perde sua base social sobrevive. Isto é uma verdade comprovada empiricamente em toda história da humanidade. Quando o número de escravos elevou-se de tal modo que tornou impraticável a continuidade do sistema escravista, Roma, que parecia eterna ruiu, e através do colonato chegamos a um novo modo de produção, o feudalismo. Depois, com a evolução das forças produtivas, co mo alargamento dos mercados, com a expulsão dos agricultores do campo, o feudalismo foi perdendo a sua base social, e, por mais que a aristocracia usasse da força para manter suas posições, a falta de base social para seu sistema fez com que o Capitalismo tornasse sistema dominante. Hoje vivemos o mesmo processo dentro do Capitalismo. O Capital deixou de ser um estímulo ao avanço das forças produtivas e hoje a extração de mais valor, de mais valia, do ser humano, passou a ser um entrave para a continuação das relações de produção. Com o predomínio do trabalho morto sobre o trabalho vivo, do capital constante sobre o capital variável, em níveis cada vez maiores dentro das unidades fabris, o capitalismo vai criando sua cova, a contradição antagônica sem solução dentro dos marcos do sistema do sistema de mercado sem mercados.
Se o capital fordista caraterizava-se pela ocupação intensiva da mão de obra, com uma participação grande do capital produtivo, do capital variável no produto final, com isto os operários financiando o próprio sistema e recebendo benesses desta simbiose, desta troca, contrariando na prática aquele aforismo escrito no Manifesto do Partido Comunista: “os operários nada tem a perder, senão suas cadeias”; o capital da automação, o moderno capital toyotista, caracteriza na predominância cada vez maior do trabalho morto sobre o trabalho vivo, por um desemprego crescente, por criações de válvulas de escape fantasistas, de ocupações artificiais para tentar contornar-se a crise incontornável, pelo ataque às conquistas da fase áurea do movimento operário para se garantir a reprodução ampliada do capital sobre uma base cada vez mais estreita. Gera uma pauperização e marginalização crescente que não pode ser revertida. Não há promessa de emprego, de ocupação para a maioria das pessoas das novas gerações. Serão os “desempregados estruturais”, gente sem função, ocupação, sem lugar e sentido num sociedade que valoriza as pessoas exatamente pelo lugar que estas ocupam nesta máquina de moer gente e fazer loucos.
Vamos gerar loucos numa profusão nunca dantes imaginada. Pessoas das quais cobramos que sejam “gente” a partir de suas ocupações dentro do Capital, mas para as quais cada vez, numa maior intensidade, menos haverá ocupações onde reproduzir a vida através do valor. É exatamente por esta razão que o Capital não consegue acabar com as grandes frentes de prostesto populares proletárias, armadas ou não. Das FARCs ao Exército Zapatista, passando pelo Movimento dos Sem Terra no Brasil, aos Movimentos Indígenas no Equador e Peru, aos Piqueteiros na Argentina, o que fica claro para estas massas que começam a se movimentar e convulsionar o continente é que para eles não há saída dentro do Capital. O Capital não pode reproduzir a mais importante ferramenta de trabalho do sistema, o SER HUMANO. Estes proletários paupérrimos, jogados fora do sistema para si são uma classe em si, no sentido que Marx colocava. Eles não têm interesses pessoais que contraditem os interesses de outras classes, não querem benesses, melhorias ou privilégios. Necessitam para sobreviver reorganizar de tal modo a produção de forma que todos tenham acesso aos produtos pertencentes à toda humanidade, sem exclusão, exceção. E isto é impossível dentro dos marcos do Capitalismo.
Esta imensa massa proletária miserável não tem outra saída para sua sobrevivência do que reorganizar de baixo a cima a sociedade, ferindo de morte uma organização social que mata o ser humano para continuar a sua sanha irracional de desbarato de todos os recursos do planeta, de destruição da natureza, da nossa nave espacial em que todos vivemos, só para não perder o controle da senzala.
Por isto, neste momento, novamente se coloca na pauta do dia a ruptura radical visando a uma sociedade do desfrute. Não podemos reproduzir os erros de uma tentativa socialista que colocou como parâmetro de desenvolvimento socialista a taxa de produção de aço. Temos a necessidade de revolucionar o homem de forma humanista. Fazer a crítica revolucionária radical da sociedade capitalista, através de uma classe, o proletariado, que não têm nada a perder senão suas cadeias, tem o novo mundo a ganhar, para inaugurar uma nova era.
Se esta classe em si, que não pode se libertar sem libertar toda a sociedade, tomar o poder, não pode repetir a lógica do Valor, do trabalho compulsivo e neurótico, esvaziador do ser humano, se não quiser condenar sua tentativa socialista ao fracasso. A passagem do reino da necessidade para o reino da liberdade não ocorrerá sem uma crítica QUALITATIVA DA PRODUÇÃO, sem que a humanidade pergunte não somente como produzir mas sim o que produzir e para que produzir. Ao contrário da lógica do Capital, que pretende manter de forma indefinida o crescimento perdulário da produção em que pese que, por exemplo, o aumento indiscriminado da produção de automóveis possa matar a terra envenenada, a nova sociedade socialista nascida dos escombros do Fetiche da Mercadoria, tem que subsumir a produção à necessidade humana de desfrute da vida.
Abolir o trabalho, este conceito que parece tão complicado, mas é tão simples, tem de ser o objetivo da esquerda radical, que necessita para renascer e incorporar este movimento social de protesto crescente livrar-se da lógica do falso marxismo, ou marxismo vulgar. A questão não é pura e simples de repartição, é de rasgar de alto a baixo o véu que encobre a escravidão burguesa e colocar claramente a atualidade da necessidade de uma transição radical para uma outra sociedade. A retomada da dialética, da teoria dos saltos, de se entender que a acumulação quantitativa tem de levar a saltos qualitativos, a rupturas que criem todo um mundo novo. Que é impossível remendar a roupa velha desta sociedade imprestável, de que o rei Capital está nu, e que agora lhe será impossível enganar muito mais tempo a grande maioria da humanidade condenada a fome, a miséria e a escravidão crescentes dentro desta crise que é um beco sem saída. Poucos, muito poucos são aqueles que podem tirar alguma benesse ainda dentro deste sistema. E mesmo estes, se tiverem um pouco de sensibilidade e conseguirem enxergar o incrível desastre social e ecológico que significa o Capital hoje em dia, vão se juntar, para bem de seus filhos e do restante das futuras gerações à crítica radical que visa na prática revolucionar e acabar de uma vez para todas com a escravidão assalariada.
Mas voltando ao nosso conceito de trabalho. Em Marx o conceito de trabalho tem dupla classificação. Ele é lato sensu: “A CONDIÇÃO NECESSÁRIA DE VIDA IMPOSTA PELA NATUREZA AO HOMEM”. Este trabalho não será abolido em nenhuma sociedade humana. Nossa língua não tem a duplicidade que outras têm, onde se diferencia, por exemplo no inglês, work e labour. A dialética marxista, onde as categorias sucedem-se no tempo de acordo com as transformações sociais reais, diferencia trabalho e trabalho. O trabalho como relação com a natureza, como reprodução da vida humana, perdurará. Todavia o “Labour”, o trabalho compulsivo, inaugurado com a propriedade privada dos meios de produção, este deve ser ABOLIDO.
Ao criticar a sociedade da gens, em “A Origem da Propriedade Privada, da Família e do Estado”, Engels demonstrava que não tinha sentido perguntar a um índio se pescar ou caçar era um trabalho. Ele simplesmente não tinha esta separação, não tinha uma compulsão externa, uma organização que tirasse dele um trabalho que lhe fosse exterior e vazio. Caçar, pescar, coletar frutos eram atividades prazerosas donde, ao mesmo tempo que ele tirava seu sustento, ele dava sentido a sua existência. Somente com a criação do Estado, com a divisão da sociedade em classes pode se criar uma máquina de extração de trabalho compulsivo, o trabalho no sentido que Marx dizia que devia ser abolido.
Marx não previa uma volta ao comunismo primitivo. Ele sabia que numa sociedade assentada sobre a carência, não poderia se organizar de uma forma superior uma sociedade igualitária, onde os seres humanos poderiam desenvolver todas as suas habilidades. Marx previa a morte do trabalho compulsivo, daquele localizado exteriormente ao homem, numa sociedade onde a produção fosse organizada de forma que não houvesse nenhuma carência, que de todos fosse tirado segundo sua capacidade e a cada qual fosse dado segundo sua necessidade. Mas uma sociedade mudada, cria homens mudados e necessidades distintas. Aí é que entra a discussão da sociedade do desfrute.
Na sociedade capitalista, como bem observou Marx, o trabalho é apenas uma parcela ínfima da atividade humana. Uma parcela miserável, agoniante, esclerosada, alienante e brutal. Com a abolição do trabalho compulsivo como norma da sociedade é possível se organizar a produção e a sociedade de forma que as pessoas prestem serviços à sociedade por no máximo três horas e tenham todo o restante do dia para o desfrute. Da arte à simples preguiça, dança e pintura, esporte ou o simples ato de dormir, ou o prazer sexual, numa sociedade liberta do PRECONCEITO DO TRABALHO, é possível fazer com que os bens, os frutos coletivos da produção cheguem a todos os seres humanos sem distinção e que não haja mais estratificação dos homens por seus bens.
À sociedade compulsiva do trabalho temos que lutar para que se siga a sociedade coletiva do desfrute, do prazer social, da humanidade organizada para que o homem seja realmente livre, não uma máquina absurda de produção de valor, que gasta quase o tempo total de suas horas acordadas trabalhando ou aprimorando (trabalhando de forma indireta) sua força produtiva. Uma loucura que cria seres parciais e insensíveis. Escravos da máquina, escravos dos produtos para os quais trabalha, escravos de uma mentalidade que hoje ameaça de forma gravíssima o futuro próximo da humanidade e de nosso planeta.
Só com a retomada humanista da crítica radical a sociedade do valor, a crítica do Capital como sistema alienador e castrador do homem, será possível recriar um movimento socialista hegemônico, necessário para disputar corações e mentes dos povos, dos proletários de todo mundo, nesta luta pela sociedade do desfrute, contra a compulsão do trabalho. Luta que significa para cada um de nós a possibilidade de haver futuro para a grande maioria da humanidade.
SOCIALISMO OU BARBÁRIE!
Venceremos!

Balbúrdia das letras: A esquerda raivosa - texto que estará no livro a s...

Balbúrdia das letras: A esquerda raivosa - texto que estará no livro a s...: A Esquerda Raivosa Na década de 60 foi cunhado epíteto jocoso para os companheiros de uma esquerda debochada e não programá...

A esquerda raivosa - texto que estará no livro a ser lançado no dia 28 de novembro


A Esquerda Raivosa

Na década de 60 foi cunhado epíteto jocoso para os companheiros de uma esquerda debochada e não programática: “A Esquerda Festiva”, chamada por alguns de PCI, ou Partido Comunista de Ipanema. Este rótulo, como tantos outros estereótipos, acabou sendo uma pecha que pegou e até companheiros engajados em partidos políticos (como Albino Pinheiro, militante do bom e velho Partidão) acabam sendo alcunhados com o apelido.
Assim como o apelido urubu (racista e preconceituoso, que quer dizer que o torcedor do flamengo é negro e favelado, mas que foi incorporado com orgulho proletário pela torcida rubro-negra), o que foi criado de maneira pejorativa, o que antes era xingamento passou a ser título. Nossa Esquerda Festiva produziu a maior parte de nosso melhor humor, e boa parte de nossa melhor literatura, crítica literária, crítica artística e crítica política, nos últimos 40 anos.Uma esquerda festiva, inteligente e erudita, capaz de zombar das estreitezas, pernosticismos, sectarismos, preconceitos, razinzices, superstições e das crenças ingênuas e messiânicas de parte da esquerda tradicional.
Há que se recuperar e recontar a história de uma esquerda que entendeu que a utopia não é um dogma, uma religião, que é possível fazer socialismo com carnaval, samba e futebol. Que João Saldanha trajado de baiana à frente da banda de Ipanema não vai ser menos comunista, marxista, revolucionário por conta deste fato. A Esquerda Festiva, com verve e sensibilidade, conseguiu aproximar-se do povo; esta esquerda viu um Marx humano, freqüentador das tabernas e apaixonado pelas mulheres, e não um puritano fundador de uma nova seita abstêmia e celibatário, um quaker de discurso operário.
Faço a apologia desta Esquerda Festiva, lutadora e engajada – cujos membros foram perseguidos, perderam seus empregos, foram presos, torturados, exilados, mortos – com forma de dizer que o socialismo não pode e não deve ser triste, taciturno, amargo, moralista, estéril, uma revivescência do puritanismo vitoriano, uma forma laica de moral religiosa anglo saxônica, uma nova inquisição vermelha; com rituais novos de bom mocismo e falso moralismo, a condenar sob uma nova cartilha do “politicamente correto” os recém criados pecados laicos.
Quando se compara a Esquerda Festiva com esta nova Esquerda Raivosa, fundamentalista e sectária, as comparações são sempre desfavoráveis a esta. A Esquerda Raivosa do falso moralismo, do ascetismo “marxista”, a esquerda que pensa, como bem dizia Lênin, que vai mudar as coisas apenas mudando seus nomes (como se a Revolução fosse uma questão lingüística, de semântica e não concreta, real). Que vê preconceito em tudo e todos e se comporta como portadora de uma nova verdade revelada, com os 10 mandamentos do profeta Marx trazidos diretos do Monte Sinai. Como nas seitas pentecostais, os nomes malditos são os populares, os que não devem ser ditos. Ficam ruborizados se alguém se utiliza da palavra puta. Aí eles gritam de forma raivosa, machismo! Preconceito! Mas o que é puta, o que é quenga, senão as formas populares de dizer prostituta, garota de programa? Assim como bunda é o nome africano e gostoso das pudicas nádegas (à forma popular é sempre a mal dita, à linguagem proletária eles preferem a linguagem polida, culta, de elite branca da USP e da PUC). Qual a diferença afinal de se dizer um ou outro? Vai mudar algo na sociedade se em lugar de uma palavra se usar outra? Se hoje uma mulher é condenada por que é uma puta, o que vai mudar se em lugar de puta ela for garota de programa? A condenação social vai ser reduzida por conta disto? Ou simplesmente vamos jogar a sujeira por debaixo do tapete, discutindo filigranas, quando deveríamos efetivamente discutir as maneiras de acabarmos com a exploração sexual das mulheres e os preconceitos subjacentes a isto? Gabriela Leite, umas das maiores militantes dos direitos das prostitutas (a quem tive o prazer de entrevistar) diz que o nome que mais a agrada ser chamada é o de puta. E que as prostitutas tem de enfrentar o estigma, agarrar o touro à unha, e o sonho dela é o dia em que a palavra puta não carregue mais nenhum sentido pejorativo, para ela o estigma não está na palavra, mas na sociedade, uma palavra não vai mudar nada (só varrer o preconceito através do “politicamente correto”).
Já a esquerda raivosa varre a sujeira para debaixo do tapete. Puta, quenga, meretriz são nomes “feios”. Então troquemo-nos! Prostituta! Não! Ainda é a prostituta uma puta, no final das contas. Ora usemos garota de programa... Bem, como o estigma não está no nome, mas na condição social, logo, logo garota de programa vai ter o mesmo valor sintático de... puta! Então troquemos garota de programa por algum eufemismo que mais parece uma tese de mestrado: mulher advinda das camadas menos favorecidas da população e que, malogrados outros meios de garantir a sua subsistência de maneira produtiva teve de vender o que há de mais íntimo, seu corpo, para auferir meio de sustentar a si mesma e a sua família. Tradução: prostituta, garota de programa, quenga, puta, meretriz.
A Esquerda Raivosa, puritana e eufemista pensa mudar as coisas mudando nomes. Pensa combater o racismo no Brasil simplesmente fixando um termo como criminoso. Fala de preconceito e racismo, mas não conhece um ponto de macumba, um terreiro de candomblé, não sabe sambar, desconhece Paulo da Portela e Candeia, mas finge defender os interesses dos negros. No fundo seu vocabulário e sua cultura são a do dominador branco, o da colônia. Escrevem uma petição contra o racismo de dia e à noite vão curtir um show de rock num bar de elite da cidade, nunca foram e não conhecem os rumos das Escolas de Samba da periferia, onde a cultura negra é celebrada em música e dança. Já a Esquerda Festiva celebrou o samba, subiu os morros, resgatou Cartola, resgatou Zé Keti, resgatou Candeia, tingiu de negro os acordes brancos da bossa-nova, fez o que realmente interessa para combater o racismo no Brasil, valorizar nossa raiz negra e seu legado na cultura brasileira atual.
Isto não quer dizer que defendo que não haja racismo e machismo no Brasil e de que suas manifestações não devam ser combatidas de forma dura, com cadeia inclusive para as manifestações ostensivas de preconceito. O Brasil é um país racista, machista em sua cultura e em sua organização social (as mulheres e os negros fazem parte da base da pirâmide, são os mais pobres, os mais explorados). Mas não se combate isto combatendo-se simplesmente nomes, combate-se isto mudando a forma de ver e pensar das gerações, e isto está ligado a reprodução de uma nova cultura que leve em conta a maravilhosa e grandiosa influência negra na nossa formação e que resgate o papel de igualdade da mulher na sociedade (antítese, por exemplo, do que se prega no funk hoje em dia, no qual a mulher é depreciada como um pedaço de carne no açougue, uma cadela, ou algo pior).
A questão do machismo tem de ser enfrentada de frente, sem eufemismos. Ela é, acima de tudo, a questão da supremacia do macho na sociedade, e isto vai muito além da questão de semântica, só pode ser mudada com uma nova co-relação nos papéis. Precisamos de muitas Naras Leão e muitas Leilas Diniz para rompermos com as barreiras que ainda colocam as mulheres como encosto de cadeira no falso elogio “atrás de todo grande homem existe uma grande mulher”. Questões fundamentais como o retorno do conservadorismo, da revalorização do casamento tradicional, da virgindade, da condenação da liberação sexual das mulheres são pouco ou nada valorizadas enquanto ficamos discutindo a criação de vocábulos que contemplem tanto o gênero masculino quanto o feminino (e que não mudam em nada a compreensão e a visão da sociedade).
A Esquerda Raivosa e puritana cala-se quando se quer discutir a questão do orgasmo feminino, por exemplo. Consideram que esta questão não é de bom tom, quando, na verdade, esta é toda a questão. Desde o momento que os homens escravizaram as mulheres, no início do patriarcado, as mulheres tiveram sacrificado seu prazer em nome da “família” e dos “filhos”. Durante milênios o assunto do gozo feminino foi um tabu (ainda o é na nossa sociedade, na qual as heroínas de novela e romance sacrificam seu prazer em pró da família ou são sacrificadas no fim, como Ana Karenina), e continua como proibido em várias culturas, nas quais as mulheres se casam virgens e sem conhecerem seus maridos. Na verdade, a Esquerda Raivosa não consegue ver o quanto há de machismo em sua atitude de não discutir este assunto, o da emancipação sexual da mulher e o do direito de gozar em plenitude do seu próprio corpo. No fundo, reproduzem a moral conservadora dominante, baseada na religião, aplicável teoricamente a todos os indivíduos, cuja perfeição é a monogamia. Atacam a prostituição somente em um dos seus dois pilares, o econômico, deixando o outro lado do pilar, a moras sexual conservadora e compulsiva. Na verdade reproduzem esta de maneira automática, até porque rechaçam Freud, Reich e todos os pensadores progressistas que lançaram luzes sob o comportamento sexual do ser humano..
A Esquerda Raivosa não vê o quanto há de machismo ao não querer falar de sexo com as mulheres, como se a questão sexual fosse de interesse restrito aos homens. A prostituição é a válvula de escape de uma sociedade que vive em permanente tensão entre o desejo e a repressão dele, entre uma propaganda hedonista e sexista do gozo, e uma moral sexual repressora familiar que sacrifica o orgasmo. Paradigma de comportamento que todos pregam e que quase ninguém cumpre (pelo menos sem o sacrifício de sua saúde física e mental). O acesso igualitário ao orgasmo entre homens e mulheres, a propaganda do direito à plena satisfação sexual, devia ser uma das bandeiras primordiais do movimento feminista. Todavia, este é um assunto incômodo, que vai de encontro à moral reinante e que, portanto, é deixado de lado pela maioria dos movimentos feministas, que chegam a falar ao direito da mulher ser dona do seu corpo e, portanto, ter direito ao aborto; mas pouco falam de que o direito ao pleno uso deste corpo significa o direito a gozar sem ser vítima de estigmas, sem ser ridicularizada, sem ser condenada, porque, afinal, uma vida sexual plena é, desde o fundamento da civilização um direito apenas do homem. O que a sociedade não consegue enxergar é que não é possível uma sociedade livre quando apenas a metade de seus membros é livre. Não é possível homens livres e plenos sexualmente, sem mulheres aptas a serem suas parceiras, que também sejam livres e plenas; posto que não são tolhidas por uma moral vitoriana atrasada, que lhes faz ser pouco mais do que uma fábrica de bebês.
Para terminar, na questão dos negros, já tocada superficialmente lá em cima, a posição da esquerda raivosa é ainda pior. Resumem a luta do negro à questão da luta contra a discriminação e pela igualdade social. Isto é importante, claro que é. Mas eu acuso: Isto não basta! Ainda que hoje fizéssemos uma revolução socialista e distribuíssemos os bens igualmente entre brancos e negros e que construíssemos leis violentas contra a discriminação, ela continuaria vigorando, porque sua raiz não foi cortada. A raiz da discriminação é a valorização da cultura do colonizador branco e a desvalorização da cultura negra. Uma revolução socialista que não compreenda isto vai continuar a reproduzir o eurocentrismo, reproduziria em uma sociedade que se pretendesse nova a velha cultura racista européia em toda sua extensão. A Esquerda Raivosa, como eu já disse, não freqüenta terreiros, não freqüenta pagodes, quadra das escolas de samba, festas populares, Candeia, para ela, é apenas o instrumento que alumia. Mas ainda assim, pretende ser o porta-voz dos explorados e oprimidos, explorados e oprimidos que ela não conhece, porque não segue a lição que deu Ho Chi Min, viver com eles, sofrer com eles, comer com eles.
E, ai de mim que levantei estas questões, estou apenas esperando que reação violenta, que altercação, a que tribunal de inquisição serei levado, já que a reação comum da Esquerda Raivosa é a de condenação, de xingamento, de execração pública.
A inquisição, nos nossos dias, ganhou forma laica e de “esquerda”.
Tem razão a Esquerda Festiva quando dizia que esta é a esquerda que a direita gosta. O discurso é de esquerda, a moral e a prática é de direita.
Incapazes de compreender o povo, de por isto inventar o novo, estão condenados à imitação. E já dizia Simón Rodríguez, o grande idealizador da liberdade dos povos da América, ou inventamos ou erramos.
A Esquerda Raivosa erra, construindo suas hipóteses sem conhecer o povo e a cultura brasileira.

Balbúrdia das letras: Almas gêmeas - poema que estará no livro a ser lan...

Balbúrdia das letras: Almas gêmeas - poema que estará no livro a ser lan...: Almas gêmeas Nossas almas se beijam e nossos lábios se tocam. Teu corpo me procura em desespero E teu perfume invade o ar em tor...

Almas gêmeas - poema que estará no livro a ser lançado dia 28 de novembro



Almas gêmeas

Nossas almas se beijam e nossos lábios se tocam.
Teu corpo me procura em desespero
E teu perfume invade o ar em torvelinho,
Brincando com as substâncias em feitiços,
Tatuando teu nome na minha carne,
Enquanto vejo meu destino desenhado
Em cada linha de tua mágica mão.

Bruxa, brincas com meu corpo como se fora
Um simples vodu em tuas garras,
Com as quais escreves poesia em minha pele
E injeta teu sangue em minhas veias
Reduzindo-me a uma parte do teu ser.
Como anjos caídos que perderam
Uma asa do par e agora, diabolicamente unidos
Podem voar abraçados
Ao mais alto céu do prazer.

Balbúrdia das letras: Bela - poema que estará no livro lançado dia 28 de...

Balbúrdia das letras: Bela - poema que estará no livro lançado dia 28 de...: Bela Teu nome vem no vento e agita as cortinas És essência diáfana Uma fumaça de feminilidade cheirosa És forte e persistente como a t...

Bela - poema que estará no livro lançado dia 28 de novembro



Bela

Teu nome vem no vento e agita as cortinas
És essência diáfana
Uma fumaça de feminilidade cheirosa
És forte e persistente como a terra e o sangue.
Teu nome se torna um corpo em forma bela
Pisas o barro com pés pequenos e finos.
Estás na minha frente, na amplidão.
É um sonho.
Só existe tua forma e o espaço
E é como se fosses um plano de existência
Em torno do qual gravito:
Mariposa entorpecido pela luz que me atrai
Contra a qual me debato,
E me machucas e me cortas
E meu sangue desce em gotículas amarelas
As quais lambes, libertando-me de todas as feridas.

II
Em meu sonho me conduzes
E me levas a teus lugares secretos
Somos cúmplices,
Nem amantes, nem amigos, apenas cúmplices.
Nosso crime nos levar a penar continuamente
Em cenários de cortinas e véus,
Solitários, lado a lado,
De pelos arrepiados,
Miando como gatos
Nesta eterna madrugada.
Minha pele te arranha,
Minha barba te tortura,
Tuas unhas me incendeiam,
Nossas línguas se misturam,
E nos perdemos nesta noite insana.
Como dois felinos boêmios e loucos
A assombrar a vizinhança
Que dorme enquanto vadiamos

III
Quando acordo, és só a brisa.
Acaricias meu corpo.
Teus dedos levemente tocam meus pelos,
Escorregam pelos meus mamilos arrepiados,
Brincam com a água que escorre no meu banho.
Espionas-me e não te vejo.
Vens em volteios novamente e beijas minha nuca
Procuro-te, mas te esvais,
Novamente de soslaio
Invades o meu espaço sem que eu possa te agarrar.
Fluis por entre meus dedos
Fecho os olhos e sinto-te por cada poro aberto.

És então silêncio.

Estás em cada canto da casa
Brincando comigo e caçoando de mim.
Deito e te deitas a meu lado,
Tuas mãos a brincar nas gotas d'água
Que escorrem por entre minhas coxas.
Mas, como és vento e fuga não te posso tocar.
Nada mais que refém sou.
Nada mais que te sentir e desejar-te posso.
Pois te vais quando queres,
Para onde queres,
Sem ao menos eu saber
Quando um dia tua chuva de abril
Voltará para me beijar em pingos.