segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Balbúrdia das letras: O porquê de lutarmos

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O porquê de lutarmos


O porquê de lutarmos

*Roberto Ponciano

Companheiros e companheiras, esses últimos dias foram fantásticos para mim. Estive, como um dos representantes da Escola 7 de Outubro em Minas Gerais, da qual a CUT-RJ faz parte, acompanhado sindicalistas da ISCOS e CISL Imola-Itália, que é uma das apoiadoras da escola, e financiadora de sua construção. Mas não pensem que vou a falar de uma troca de experiências internacionais. Os sindicalistas da Itália não são os protagonistas da história que vou contar, mas sim os catadores e principalmente as catadoras de rua que representam 68% da força de trabalho da reciclagem de lixo MG.

A pedido da escola fiquei com os sindicalistas italianos cinco em Belo Horizonte, e o “turismo” que nós fizemos foi visitar sete unidades de reciclagem, galpões, situados na Região Metropolitana de Belo Horizonte, onde o material reciclável é triado e preparado para a venda. Confesso que tenho andado um pouco desanimado com a luta sindical, ou melhor, com falta de perspectiva global, já que nunca deixei de lutar e participar. A luta sindical por vezes é extremamente corporativa, e nos faz esquecer efetivamente o porquê lutamos.

Visitar aqueles galpões me fez relembrar isto. Uma coisa é lutar para aumentar o salário da minha categoria de classe média, um objetivo realmente digno, importante, mas que não vai mudar o mundo e ainda escutar críticas ferozes contra o governo num todo, por conta de não termos conseguido o nosso aumento, outra coisa é lutar para mudar as condições de vida de pessoas que não faz muito tempo estavam relegadas à absoluta miséria. Na luta sindical muitas vezes toda a visão global de país então desce a um míope juízo de valor de se o governo deu ou não deu aumento salarial para nossa categoria.

Embora ache tático e importante esta luta e faça parte da análise do meu juízo de valor o quanto o governo vai dar para os servidores públicos, isto não determina minha análise se o Governo Lula ou Dilma é bom ou ruim. O fato é que os projetos sociais, apoiados neste e pelo atual governo têm mudado a vida de milhões de brasileiros. Não só os projetos. O governo não tem que fazer tudo ou ser paternalista, ele faz realmente a parte dele, nunca dantes na história deste país houve tal atenção à questão social.

Do outro lado o próprio movimento social tem que buscar sua dignidade (e pensar ações também em outras formas de relação de trabalho), como o fazem as catadoras e catadores de BH da Região Metropolitana. Me oxigenou a militância conversar com catadores que antes da transformação da vida deles, viviam desempregados ou faziam catação nos lixões, em condições extremas. Eles eram extremamente discriminados, eram invisíveis à sociedade. No seminário tinha até uma ex-catadora que hoje é universitária na Universidade Federal de Viçosa, uma das representantes da política de cotas do Governo Lula.

Raposos, um dos municípios onde há uma associação filiada a REDESOL MG, a qual visitamos, é um município destruído pela mineração. A Anglo-Gold, empresa inglesa, depois de extrair todo o ouro deixou só os cacos na cidade, é dona de toda a região. Após a desativação da atividade mineradora a cidade ficou sem empregos. A pouca mão de obra empregada ou é num pequeno comércio, ou os moradores buscam as cidades vizinhas para trabalhar para o governo (em órgãos públicos), na Fiat, ou na Vale. Hoje, a empresa financia projetos de desenvolvimento local para a cidade e região. A cidade só não está pior, também, por conta do bolsa família.

Antes, segundo relatos dos próprios moradores, havia muitas crianças fora da escola, mas como o benefício, que parece pequeno, é maior do que catar lixo nos lixões, trabalhar para carvoarias, os próprios pais fazem de tudo para deixar as crianças na escola. Receber R$ 20, R$ 200, pode parecer muito pouco para nós da classe média, mas para gente (como alguns dos trabalhadores dos empreendimentos, conceito que reúne cooperativa e associação cooperativa de lixo materiais recicláveis) é um banquete, uma vez que há meses em que não chegam a ganhar R$300 devido a diminuição do valor de venda do material.

Só no mês de dezembro é que conseguiram pagar um salário mínimo de R$ 510. O esforço da cooperativa de cada empreendimento é que todos os meses se chegue minimamente a este valor. Visitamos experiências das mais variadas, com diferentes graus de organização e estrutura. As realidades não são iguais. Há catadores individuais que trabalham de forma precária, mas chegam a tirar por mês R$1.200. Essa é uma das dificuldades para organizar a categoria em empreendimentos.

Só conversando com eles, se tem ideia da importância destes programas sociais (governamentais como um todo) para uma vida digna desses desses trabalhadores que diminuem os impactos e consequências ambientais da nossa sociedade de consumo. Durante uma semana, tomei um banho de realidade e contra a invisibilidade que está tão perto da gente e que a gente ignora, completamente. O mais bonito foi ver aquelas mulheres, principalmente, e aqueles homens, se apoderarem da sua dignidade. Se antes catavam lixo e ganhavam menos de R$ 100 por mês, hoje a maioria dos empreendimentos conseguem garantir ao menos um salário mínimo, e já há cooperativas gerando renda de R$ 900 por mês.

O que antes era subemprego virou profissão regulamentada no governo Lula, e com o trabalho de formação ideológica de centrais de empreendimentos, como a REDESOL-MG, das cooperativas (existem associações também), que explicam para estas trabalhadoras e trabalhadores a importância deles para a sociedade e a vivência destas pessoas dentro destes espaços, o efeito na recuperação da autoestima e da dignidade é fantástico, (há um resgate e exercício da cidadania). De segunda a quinta eu estive no meio de pessoas trabalhando com verdadeiras montanhas de materiais recicláveis para serem triados, na sexta eu estive no seminário. E como é espantosa a transformação daquelas mulheres e homens. Ao vê-los trabalhando com seus macacões de catadores, suas blusas e luvas, não se pode imaginar completamente como viraram protagonistas das suas histórias. Não mais marginais, não mais aceitam serem marginalizados como eram antes nas ruas. Agora vivem em casas, agora pagam aluguel ou conseguiram uma moradia do “Minha Casa, Minha Vida”.

No seminário, mulheres vaidosas, lindas, com unhas pintadas, bem arrumadas, com seus vestidos de festa, tomaram o microfone e se apoderaram de discursos altamente inflamados e não-alienados. Fiquei com uma ponta de inveja. Nós da classe média, nas nossas assembleias sindicais não temos um décimo da consciência de classe destas pessoas. Elas valorizam seu trabalho, sabem que estão salvando o planeta, sabem da importância delas na luta por um país e um mundo melhor. Não é uma discussão sindical apenas de índice de aumento salarial, antes, é uma discussão global da importância do seu trabalho, da sua vida e do seu papel na sociedade.

É sempre bom um banho de realidade para descobrir ou redescobrir o porquê lutamos. Se não perdemos de foco, o horizonte de nossa luta, a perspectiva de uma sociedade melhor passaremos a pensar que efetivamente o objetivo da luta sindical e da luta dos movimento sociais em geral é apenas por aumentos corporativos, sem pensar na sociedade como um todo e no futuro de um projeto de Nação que incorpore estas e outras pessoas. Todos os meus diplomas não me valeram de nada lá, voltei a me sentir um analfabeto político e só posso agradecer a estes catadores e catadoras por tudo que me ensinaram.


* Diretor do Sisejufe e de Formação da CUT-RJ

sábado, 15 de janeiro de 2011

Balbúrdia das letras: Banho de realidade

Balbúrdia das letras: Banho de realidade: " Companheiros e companheiras, esta semana foi uma semana fantástica para mim. Estive, como um dos repre..."

Banho de realidade

    Companheiros e companheiras, esta semana foi uma semana fantástica para mim.
    Estive, como um dos representantes da Escola 7 de Outubro em Minas Gerais (da qual a CUT-RJ faz parte) acompanhados sindicalistas da CISLA-Itália, que é uma das apoiadoras da escola, e foi quem financiou sua construção.
    Mas não pensem que vou a falar de uma troca de experiências internacionais, os sindicalistas da Itália não são os protagonistas da estória que vou contar, mas sim os catadores e principalmente as catadoras de rua (68% da força de trabalho da reciclagem de lixo).
    A pedido da escola fiquei com os sindicalistas os cinco dias deles em Belo Horizonte, e o "turismo" que nós fizemos foi visitar cerca de 7 unidades de reciclagem, Galpões de lixo em BH e na grande BH.
    Confesso que tenho andado um pouco desanimado com a luta sindical, ou melhor, com falta de perspectiva global dela, já que nunca deixei de lutar e participar. A luta sindical por vezes é extremamente corporativa, e nos faz esquecer efetivamente o PORQUÊ LUTAMOS.
    Visitar aqueles galpões me fez relembrar isto. Uma coisa é lutar para aumentar o salário da minha categoria de classe média, um objetivo realmente digno, importante, mas que não vai mudar o mundo e ainda escutar críticas ferozes contra o Governo num todo, por conta de não termos conseguido o nosso aumento.
    Toda a visão global de país então desce a um míope juízo de valor de se o governo deu ou não deu aumento salarial para nossa categoria.
    Embora ache tático e importante esta luta e faça parte da análise do meu juízo de valor o quanto o governo vai dar para os servidores públicos, isto não determina minha análise se o Governo Lula ou Dilma é bom ou ruim.
    O fato é que os projetos sociais, apoiados neste e por este Governo tem mudado a vida de milhões de brasileiros.
    Não só os projetos do Governo, o Governo não tem que fazer tudo ou ser paternalista, ele faz realmente a parte dele, nunca dantes na história deste país houve tal atenção à questão social.
    Do outro lado o próprio movimento social tem que buscar sua dignidade, como o fazem as catadoras (principalmente) e os catadores de lixo, as recicladoras e os recicladores de BH.
    Me oxigenou a militância conversar com catadores que antes da transformação da vida deles, viviam nos lixões, junto com seus filhos, eram extremamente discriminados, eram invisíveis à sociedade.
    Tinha até uma ex catadora que hoje é universitária na Universidade Federal de Viçosa (política de cotas do Governo Lula).
    Em Raposos, uma cidade destruída pela mineração, a Anglo, uma empresa inglesa, depois de extrair todo o ouro, deixou só os cacos na cidade, é dona de toda a cidade e a cidade vive sem empregos.
    A pouca mão de obra empregada ou é num pequeno Comércio, ou viaja para as cidades vizinhas para se empregar no Governo, na Fiat, na Vale.
    A cidade só não está pior por conta do bolsa família.
    Antes, segundo relatos dos próprios moradores, havia muitas crianças fora da escola, mas como o benefício, que parece pequeno, é maior do que catar lixo, trabalhar para carvoarias ou outros sub-empregos, os próprios pais fazem de tudo para deixar as crianças na escola.
    20 reais, 200 reais, pode parecer muito pouco para nós da classe média, mas para gente, como os trabalhadores da Cooperativa de lixo, alguns meses, separam para reciclagem lixo o mês inteiro, para ganhar de 100 a 300 reais, é um banquete. Só no mês de dezembro é que conseguiram pagar um salário mínimo. O esforço da cooperativa é que todos os meses se chegue minimamente a este valor.
    Só conversando com eles, se tem idéia da importância destes programas sociais (não tenham dúvida, vieram para ficar e toda a sociedade desigual brasileira tem que arcar com eles, tem que pagar por eles através dos impostos) para uma vida digna para estas e estes trabalhadores jogados à margem da sociedade de consumo.
    Durante uma semana, tomei um banho de realidade e contra a invisibilidade desta Etiópia que está tão perto da gente e que a gente ignora, completamente.
    O mais bonito foi ver aquelas mulheres (principalmente) e aqueles homens se apoderarem da sua dignidade. Se antes catavam nos lixões e ganhavam menos de 100 reais ao mês, hoje a maioria das cooperativas paga ao menos uma salário mínimo, e já há cooperativas gerando renda de 900, mil reais mês.
    O que antes era subemprego virou profissão, e com o trabalho ideológico das cooperativas, que explicam para estas trabalhadoras e trabalhadores a importância deles para a sociedade, o efeito na recuperação da auto-estima e dignidade é fantástico.
    De segunda a quinta eu estive nos lixões, na sexta eu estive no seminário.
    E como é espantosa a transformação daquelas mulheres e homens. Ao vê-los trabalhando com seus macacões de catadores, suas blusas e luvas, não se pode imaginar completamente como viraram protagonistas das suas histórias.
    Não mais marginais, não mais aceitam serem marginalizados como eram antes nas ruas e nos lixões. Agora vivem em casas, agora pagam aluguel ou conseguiram uma moradia do Minha Casa, Minha Vida.
    Na sexta, no seminário, mulheres vaidosas, lindas, com unhas pintadas, bem arrumadas, com seus vestidos de festa, tomaram o microfone e se apoderaram de discursos altamente inflamados e não-alienados.
    Fiquei com uma ponta de inveja. Nós da classe média, nas nossas assembléias sindicais não temos 1/10 da consciência de classe destas pessoas.
    Elas valorizam seu trabalho, sabem que estão salvando o planeta, sabem da importância delas e deles na luta por um país e um mundo melhor. Não é uma discussão sindical apenas de índice de aumento salarial, antes, é uma discussão global da importância do seu trabalho, da sua vida e do seu papel na sociedade.
    É sempre bom um banho de realidade para descobrir ou redescobrir o "PORQUÊ LUTAMOS".
    Se não perdemos de foco o horizonte de nossa luta, a perspectiva de uma sociedade melhor, socialistas, e passamos a pensar que efetivamente o objetivo da luta sindical e da luta dos movimento sociais em geral é apenas por aumentos corporativos, sem pensar na sociedade como um todo e no futuro de um projeto de Nação que incorpore estas e outras pessoas.
    Todos os meus diplomas não me valeram de nada lá, voltei a me sentir um analfabeto político e só posso agradecer a estes catadores e catadoras por tudo que me ensinaram.