Com
o Exército Vermelho em Berlim
70
Anos da Vitória Sobre o Eixo Nazi-Facista.
Stalingrado, o Verdadeiro
dia D.
Saber que resistes.
Que enquanto dormimos, comemos e trabalhamos
resistes.
Que quando abrimos o jornal pela manhã teu nome
(em ouro oculto) estará firme no alto da página.
Terá custado milhares de homens, tanques e
aviões, mas valeu a pena.
Saber que vigias, Stalingrado, sobre nossas
cabeças, nossas prevenções e nossos confusos pensamentos distantes dá um enorme
alento à alma desesperada e ao coração que duvida.
Carlos Drumond de Andrade in Carta a Stalingrado
Este ano a humanidade celebra os 70 anos da vitória
sobre o Eixo Nazi-Facista, numa guerra que gerou o genocídio de 50 milhões de
vidas. Faz pouco tempo vimos a comemoração da Invasão da Normandia, uma batalha
que passou a ser designada como o “Dia D” da Segunda Grande Guerra e denominada
de forma mentirosa pelos historiadores ocidentais como a mais importante
batalha da luta contra os nazi-facistas. Como uma mentira dita mil vezes acaba
por virar uma verdade, vamos relatar e recobrar historicidade da resistência
soviética ao nazismo e mostrar a batalha de Stalingrado, o verdadeiro dia D e a
maior batalha da 2ª Grande Guerra Mundial.
Antes de tudo
é interessante mostrar que o regime nazista de Hitler nada tinha em comum com o
Socialismo Soviético. Por mais que tenha havido terríveis erros na condução do
Socialismo Russo, ele era o grande inimigo a ser batido, o país dos sovietes
que tinha de ser banido do mapa, o inimigo principal da Alemanha Hitleriana.
Desde a ascensão de Hitler ao poder que a União Soviética denunciava aos
aliados (França, Inglaterra e Alemanha) o rearmamento alemão e os planos
imperialistas expansionistas germânicos. Os aliados não só fingiam não ver a
escalada guerreirista alemã, como exultavam com a possibilidade de uma guerra
alemã à União Soviética.
Durante a
Guerra Civil Espanhola, enquanto a Luftwaff alemã pode impunemente rasgar os
céus franceses para bombardear os soldados e as cidades republicanas, o governo
francês proibiu que o Exército Vermelho passasse pela França para combater do
lado dos republicanos e dificultou sobremaneira o envio de armas pela União
Soviétca aos resistentes da República assassinada. O resultado histórico disto
todos já sabem, mas há um outro, a Alemanha nazista pode treinar táticas de
guerra aérea impunemente com as benções de todas as potências “liberais e
democráticas”.
Diante da
imobilidade e da simpatia do Ocidente frente à Alemanha Nazista nasce o pacto
de não agressão Germano-soviético. O pacto jamais foi um pacto de cooperação
militar. A diplomacia dos dois países jactava-se de ter tido uma vitória
política sobre o outro. Pelo lado alemão, Hitler achava que com o pacto poderia
operar mais livremente a guerra contra o resto da Europa, pelo lado Soviético,
Stálin acreditava que entrar em guerra contra a Alemanha naquele momento seria
suicídio, e que era necessário um esforço concentrado de guerra para fazer
frente ao inimigo. Ambos queriam ganhar tempo para um confronto que viria mais
tarde. A história provaria quem estava correto. Na URSS o dia de trabalho que
já era de 8 horas por dia em 1927 (é bom lembrar que no Brasil esta conquista
data de 1988) foi estendido para 12 horas e indústrias inteiras foram mudadas
para equipamentos bélicos para o esforço de guerra.
Houve um
grande erro estratégico diante do pacto. Stálin considerou que a Alemanha
Nazista só teria condições de invadir a URSS em 1943 e se descuidou de sua
defesa na linha de frente(embora os soviéticos nunca tenham alimentado nenhuma
ilusão de que não haveria luta contra o nazismo). Assim, quando a Alemanha
invadiu a União Soviética em julho de 1941, em que pese todo o esforço
industrial de guerra, parecia efetivamente que em meses a União Soviética
deixaria de existir. De um total de 7.500 aviões, os soviéticos perderam 4 mil
só na primeira semana. Considera-se que a URSS perdeu 80% da aviação e mais de
50% dos tanques nos dois primeiros meses do ataque alemão.
Até outubro os
nazistas já haviam cercado Leningrado e estavam às portas de Moscou. Até
novembro o saldo de destruição era inimaginável de um país poder resistir a
ele: 670 mil soldados soviéticos capturados, destruídos 3200 tanques, 15.500
aeronaves (lembrem que a URSS só tinha 7.500 no início da guerra, ou seja,
haviam sido dizimada duas vezes a força aérea russa), 57.600 veículos, 1.200
peças de artilharia e 1200 locomotivas.
O Mito do General Inverno:
Há um mito
ocidental de que os russos só conseguiram derrotar os alemães por conta do
“General Inverno”. É verdade que a chegada do pesado inverno atrasou a guerra
alemã, mas os alemães não foram parados só pela neve, e não foram derrotados
por ela. Foram derrotados inclusive no campo da tecnologia e da produção, pela
capacidade da URSS se reorganizar em meio ao cataclisma e produzir aeronaves e
tanques em tempo recorde, numa velocidade inimaginável. Campos inteiros eram
queimados e indústrias eram desmontadas em dias e remontadas na retaguarda. O
soldado soviético, vendo que o inimigo alemão assassinava impiedosamente até os
civis passou a combater até a morte. Na retaguarda alemã uma incrível guerrilha
começa a minar a força e o ânimo dos combatentes germânicos.
O frio fez
estragos grandiosos no lado soviético. Sitiados em Leningrado, 1 milhão de
pessoas morreram de fome e frio. Só que o Exército soviético estava
TECNOLÓGICAMENTE MELHOR PREPARADO PARA O FRIO. Desde as vestimentas, até o
tanque e o óleo. Enquanto o óleo dos aeromotores alemães congelava nos tanques
e não os deixava decolar, a força aérea soviética, na mesma velocidade que
perdia aviões, os fabricava, e conduzia missões consideradas impossíveis em
pleno inverno.
Dos sucessos
iniciais de 1941 e 1942, a Luftwaff alemã começou a ser batida no ar pela
aviação russa em 1943, em maior número e, agora, desenvolvendo em plena guerra
aviões tal ou mais velozes que os alemães, capazes de abater os antes
inexpugnáveis inimigos aéreos.
No chão, as
tropas panzers perderam sua superioridade. Se no início da guerra os panzers
enfrentam os obsoletos B50 soviéticos, estes sendo destruídos na proporção de 2
por 1, agora enfrentavam os terríveis T34. Mais velozes, melhores blindados,
melhor manobráveis no terreno difícil, com um alcance de tiro maior. Pela
primeira vez durante a guerra os nazistas enfrentam um inimigo que tinha
superioridade na batalha dos tanques. Isto afeta de maneira o ânimo alemão.
Divisões inteiras são destruídas em batalhas de tanques descomunais onde os T34
precedem ao avanço das tropas russas.
Stalingrado,
também estava cercada desde julho de 1942. Um monte de ruínas com soldados
soviéticos escondidos praticamente nos entulhos e nos subterrâneos da cidade,
era a última cidadela contra o avanço do Exército Alemão rumo ao Petróleo e o
trigo dos campos soviéticos. 70% de toda a força militar do Eixo encontrava-se
na URSS neste momento (incluindo suas tropas mais capazes). Hitler queria
capturar Stalingrado e seguir rumo a leste, para se juntar aos japoneses que
estavam prontos para invadir a Ìndia e rumo ao Sul para juntar as tropas de
Rommel que combatia no oriente.
Numa
resistência tenaz a cidade resiste 200 dias, cercada, com fome, muitas vezes
com dificuldades de se abastecer de munições. Três exércitos alemães, dois
romenos, um húngaro e um italiano cercam Stalingrado. A situação parecia pender
para a Alemanha, mas, devido a grande resistência militar, ao grande esforço do
povo soviético durante a guerra para suprir o exército vermelho e a
superioridade tecnológica e bélica conseguida devido a isto, a cidade não só
resiste, na batalha mais sangrenta da história, mas, incrivelmente, os soviéticos
contra-atacam e aí começa o fim do nazi-facismo.
Os exércitos
soviéticos conseguem com a ajuda da força aérea e dos T34 flanquear os
exércitos romenos e cercam aproximadamente 300 mil soldados alemães em novembro
de 1942. Os alemães ainda resistem dois meses, mas em 16/01/1943 o general
Paulus entrega-se com o remanescente do seu exército. Na batalha de Stalingrado
os soldados do Eixo haviam perdido cerca de 800 mil homens, o Exército Vermelho
havia perdido 1 milhão e 100 mil (o exército americano, durante toda a guerra
perdeu 300 mil).
Depois da
derrota de Stalingrado a máquina bélica alemã foi completamente desbaratada, os
soviéticos bateram as tropas alemãs até Berlim. Os aliados não invadiram a
Normandia senão depois da vitória soviética em Stalingrado (embora Stálin
clamasse por esta invasão fazia tempo) e a celeridade na invasão da Normandia
se deveu principalmente ao medo de que URSS tomasse toda a Alemanha sozinha, já
que efetivamente a Alemanha já estava militarmente irremediavelmente derrotada.
Fica claro então que o verdadeiro dia D da Segunda Guerra foi a batalha de
Stalingrado, que mesmo que não houvesse a invasão da Normandia os nazistas
teriam sido vencidos sozinhos pelo Exército Vermelho que já havia derrotado o
grosso das tropas alemães e as estava levando de volta para o Reichstag.
Embaixo, o
relato de uma carta de um soldado soviético na luta sem rendição contra os
nazi-facistas:
“Aqui está a
carta de Alexandr Golikov, escrita em tanque alvejado por projétil inimigo.
‘Neste instante estamos em combate cruel, de vida ou morte. O nosso tanque foi
danificado. Por todos os lados vejo soldados nazi-facistas. O dia todos estamos
rechaçando o ataque. A rua está cheia de corpos em uniformes verdes. Ficamos
com vida Pavel Abramov e eu. No tanque furado igual peneira e todo
escangalhado. Não temos uma gota de água sequer. O tanque estremece com os
golpes do inimigo, mas, por enquanto estamos com vida. Já não temos projéteis.
A munição está se esgotando. Pável atira contra os inimigos com tiro certeiro,
eu estou “conversando” com você, como sempre. A sua fotografia está em meus
joelhos. Eu sei que é a última vez... Através das brechas no tanque eu vejo as
árvores verdejantes, flores no jardim – de cores vivas, vivas. Vocês que
sobreviveram à guerra, terão após a guerra uma vida tão linda, como essas
flores e serão felizes. Por uma vida assim não temo a morte’. Carta
milagrosamente encontrada num tanque onde estavam dois soviéticos mortos: após
a morte do primeiro combatente, o segundo tomou seu lugar atirando. Quando a
munição acabou ele tocou fogo no tanque.”
Roberto
Ponciano é escritor, com quatro livros publicados, filósofo e professor
universitário. Mestre em Filosofia pela UGF com linha de pesquisa sobre Karl
Marx, Alan Badiou e Lukács