segunda-feira, 4 de maio de 2015

Com o Exército Vermelho em Berlim

Com o Exército Vermelho em Berlim
70 Anos da Vitória Sobre o Eixo Nazi-Facista.
Stalingrado, o Verdadeiro dia D.

Saber que resistes.
Que enquanto dormimos, comemos e trabalhamos resistes.
Que quando abrimos o jornal pela manhã teu nome (em ouro oculto) estará firme no alto da página.
Terá custado milhares de homens, tanques e aviões, mas valeu a pena.
Saber que vigias, Stalingrado, sobre nossas cabeças, nossas prevenções e nossos confusos pensamentos distantes dá um enorme alento à alma desesperada e ao coração que duvida.
Carlos Drumond de Andrade in Carta a Stalingrado

Este ano a humanidade celebra os 70 anos da vitória sobre o Eixo Nazi-Facista, numa guerra que gerou o genocídio de 50 milhões de vidas. Faz pouco tempo vimos a comemoração da Invasão da Normandia, uma batalha que passou a ser designada como o “Dia D” da Segunda Grande Guerra e denominada de forma mentirosa pelos historiadores ocidentais como a mais importante batalha da luta contra os nazi-facistas. Como uma mentira dita mil vezes acaba por virar uma verdade, vamos relatar e recobrar historicidade da resistência soviética ao nazismo e mostrar a batalha de Stalingrado, o verdadeiro dia D e a maior batalha da 2ª Grande Guerra Mundial.
Antes de tudo é interessante mostrar que o regime nazista de Hitler nada tinha em comum com o Socialismo Soviético. Por mais que tenha havido terríveis erros na condução do Socialismo Russo, ele era o grande inimigo a ser batido, o país dos sovietes que tinha de ser banido do mapa, o inimigo principal da Alemanha Hitleriana. Desde a ascensão de Hitler ao poder que a União Soviética denunciava aos aliados (França, Inglaterra e Alemanha) o rearmamento alemão e os planos imperialistas expansionistas germânicos. Os aliados não só fingiam não ver a escalada guerreirista alemã, como exultavam com a possibilidade de uma guerra alemã à União Soviética.
Durante a Guerra Civil Espanhola, enquanto a Luftwaff alemã pode impunemente rasgar os céus franceses para bombardear os soldados e as cidades republicanas, o governo francês proibiu que o Exército Vermelho passasse pela França para combater do lado dos republicanos e dificultou sobremaneira o envio de armas pela União Soviétca aos resistentes da República assassinada. O resultado histórico disto todos já sabem, mas há um outro, a Alemanha nazista pode treinar táticas de guerra aérea impunemente com as benções de todas as potências “liberais e democráticas”.
Diante da imobilidade e da simpatia do Ocidente frente à Alemanha Nazista nasce o pacto de não agressão Germano-soviético. O pacto jamais foi um pacto de cooperação militar. A diplomacia dos dois países jactava-se de ter tido uma vitória política sobre o outro. Pelo lado alemão, Hitler achava que com o pacto poderia operar mais livremente a guerra contra o resto da Europa, pelo lado Soviético, Stálin acreditava que entrar em guerra contra a Alemanha naquele momento seria suicídio, e que era necessário um esforço concentrado de guerra para fazer frente ao inimigo. Ambos queriam ganhar tempo para um confronto que viria mais tarde. A história provaria quem estava correto. Na URSS o dia de trabalho que já era de 8 horas por dia em 1927 (é bom lembrar que no Brasil esta conquista data de 1988) foi estendido para 12 horas e indústrias inteiras foram mudadas para equipamentos bélicos para o esforço de guerra.
Houve um grande erro estratégico diante do pacto. Stálin considerou que a Alemanha Nazista só teria condições de invadir a URSS em 1943 e se descuidou de sua defesa na linha de frente(embora os soviéticos nunca tenham alimentado nenhuma ilusão de que não haveria luta contra o nazismo). Assim, quando a Alemanha invadiu a União Soviética em julho de 1941, em que pese todo o esforço industrial de guerra, parecia efetivamente que em meses a União Soviética deixaria de existir. De um total de 7.500 aviões, os soviéticos perderam 4 mil só na primeira semana. Considera-se que a URSS perdeu 80% da aviação e mais de 50% dos tanques nos dois primeiros meses do ataque alemão.
Até outubro os nazistas já haviam cercado Leningrado e estavam às portas de Moscou. Até novembro o saldo de destruição era inimaginável de um país poder resistir a ele: 670 mil soldados soviéticos capturados, destruídos 3200 tanques, 15.500 aeronaves (lembrem que a URSS só tinha 7.500 no início da guerra, ou seja, haviam sido dizimada duas vezes a força aérea russa), 57.600 veículos, 1.200 peças de artilharia e 1200 locomotivas.
O  Mito do General Inverno:
Há um mito ocidental de que os russos só conseguiram derrotar os alemães por conta do “General Inverno”. É verdade que a chegada do pesado inverno atrasou a guerra alemã, mas os alemães não foram parados só pela neve, e não foram derrotados por ela. Foram derrotados inclusive no campo da tecnologia e da produção, pela capacidade da URSS se reorganizar em meio ao cataclisma e produzir aeronaves e tanques em tempo recorde, numa velocidade inimaginável. Campos inteiros eram queimados e indústrias eram desmontadas em dias e remontadas na retaguarda. O soldado soviético, vendo que o inimigo alemão assassinava impiedosamente até os civis passou a combater até a morte. Na retaguarda alemã uma incrível guerrilha começa a minar a força e o ânimo dos combatentes germânicos.
O frio fez estragos grandiosos no lado soviético. Sitiados em Leningrado, 1 milhão de pessoas morreram de fome e frio. Só que o Exército soviético estava TECNOLÓGICAMENTE MELHOR PREPARADO PARA O FRIO. Desde as vestimentas, até o tanque e o óleo. Enquanto o óleo dos aeromotores alemães congelava nos tanques e não os deixava decolar, a força aérea soviética, na mesma velocidade que perdia aviões, os fabricava, e conduzia missões consideradas impossíveis em pleno inverno.
Dos sucessos iniciais de 1941 e 1942, a Luftwaff alemã começou a ser batida no ar pela aviação russa em 1943, em maior número e, agora, desenvolvendo em plena guerra aviões tal ou mais velozes que os alemães, capazes de abater os antes inexpugnáveis inimigos aéreos.
No chão, as tropas panzers perderam sua superioridade. Se no início da guerra os panzers enfrentam os obsoletos B50 soviéticos, estes sendo destruídos na proporção de 2 por 1, agora enfrentavam os terríveis T34. Mais velozes, melhores blindados, melhor manobráveis no terreno difícil, com um alcance de tiro maior. Pela primeira vez durante a guerra os nazistas enfrentam um inimigo que tinha superioridade na batalha dos tanques. Isto afeta de maneira o ânimo alemão. Divisões inteiras são destruídas em batalhas de tanques descomunais onde os T34 precedem ao avanço das tropas russas.
Stalingrado, também estava cercada desde julho de 1942. Um monte de ruínas com soldados soviéticos escondidos praticamente nos entulhos e nos subterrâneos da cidade, era a última cidadela contra o avanço do Exército Alemão rumo ao Petróleo e o trigo dos campos soviéticos. 70% de toda a força militar do Eixo encontrava-se na URSS neste momento (incluindo suas tropas mais capazes). Hitler queria capturar Stalingrado e seguir rumo a leste, para se juntar aos japoneses que estavam prontos para invadir a Ìndia e rumo ao Sul para juntar as tropas de Rommel que combatia no oriente.
Numa resistência tenaz a cidade resiste 200 dias, cercada, com fome, muitas vezes com dificuldades de se abastecer de munições. Três exércitos alemães, dois romenos, um húngaro e um italiano cercam Stalingrado. A situação parecia pender para a Alemanha, mas, devido a grande resistência militar, ao grande esforço do povo soviético durante a guerra para suprir o exército vermelho e a superioridade tecnológica e bélica conseguida devido a isto, a cidade não só resiste, na batalha mais sangrenta da história, mas, incrivelmente, os soviéticos contra-atacam e aí começa o fim do nazi-facismo.
Os exércitos soviéticos conseguem com a ajuda da força aérea e dos T34 flanquear os exércitos romenos e cercam aproximadamente 300 mil soldados alemães em novembro de 1942. Os alemães ainda resistem dois meses, mas em 16/01/1943 o general Paulus entrega-se com o remanescente do seu exército. Na batalha de Stalingrado os soldados do Eixo haviam perdido cerca de 800 mil homens, o Exército Vermelho havia perdido 1 milhão e 100 mil (o exército americano, durante toda a guerra perdeu 300 mil).
Depois da derrota de Stalingrado a máquina bélica alemã foi completamente desbaratada, os soviéticos bateram as tropas alemãs até Berlim. Os aliados não invadiram a Normandia senão depois da vitória soviética em Stalingrado (embora Stálin clamasse por esta invasão fazia tempo) e a celeridade na invasão da Normandia se deveu principalmente ao medo de que URSS tomasse toda a Alemanha sozinha, já que efetivamente a Alemanha já estava militarmente irremediavelmente derrotada. Fica claro então que o verdadeiro dia D da Segunda Guerra foi a batalha de Stalingrado, que mesmo que não houvesse a invasão da Normandia os nazistas teriam sido vencidos sozinhos pelo Exército Vermelho que já havia derrotado o grosso das tropas alemães e as estava levando de volta para o Reichstag.
Embaixo, o relato de uma carta de um soldado soviético na luta sem rendição contra os nazi-facistas:
“Aqui está a carta de Alexandr Golikov, escrita em tanque alvejado por projétil inimigo. ‘Neste instante estamos em combate cruel, de vida ou morte. O nosso tanque foi danificado. Por todos os lados vejo soldados nazi-facistas. O dia todos estamos rechaçando o ataque. A rua está cheia de corpos em uniformes verdes. Ficamos com vida Pavel Abramov e eu. No tanque furado igual peneira e todo escangalhado. Não temos uma gota de água sequer. O tanque estremece com os golpes do inimigo, mas, por enquanto estamos com vida. Já não temos projéteis. A munição está se esgotando. Pável atira contra os inimigos com tiro certeiro, eu estou “conversando” com você, como sempre. A sua fotografia está em meus joelhos. Eu sei que é a última vez... Através das brechas no tanque eu vejo as árvores verdejantes, flores no jardim – de cores vivas, vivas. Vocês que sobreviveram à guerra, terão após a guerra uma vida tão linda, como essas flores e serão felizes. Por uma vida assim não temo a morte’. Carta milagrosamente encontrada num tanque onde estavam dois soviéticos mortos: após a morte do primeiro combatente, o segundo tomou seu lugar atirando. Quando a munição acabou ele tocou fogo no tanque.”


Roberto Ponciano é escritor, com quatro livros publicados, filósofo e professor universitário. Mestre em Filosofia pela UGF com linha de pesquisa sobre Karl Marx, Alan Badiou e Lukács